Os penitentes saem das casas ao lusco-fusco
E ao lusco-fusco caminham por estradas sem distância.
Os penitentes levam na mão um nodoso bordão
E na alma uma incomensurável Fé
E fazem sempre muitos calos no pé.
Os penitentes são de muitas cidades e de muitas idades
E de condições plurais ; e não soltam ais
Quando os músculos já doem
Quando as pernas vacilam
Quando os corpos se encharcam
Em Deus e em suores devotos; e também
Em inevitabilidades de carne viva.
Os penitentes gostam de orar nos longos caminhos
Muito sofridos e onde carinhos não abundam.
Por vezes, automóveis arquejantes em velocidades impiedosas
Matam os penitentes piedosos e os jornais do dia seguinte
Anunciam que morreu atropelado um penitente
E que não foi realizado o teste alcoólico
Porque o penitente trazia no bornal um papelinho
Dobrado em quatro vincos onde dizia que perdoava,
Que perdoava tudo a todos ( e também obviamente
À carripana desarvorada). Os penitentes morrem então
De excesso de octanas e de míngua de código da estrada.
Tenho pena de nunca ter sido um penitente.
Por agora, limito-me a ser um resistente
Já não é mau. Resisto ao Tempo. Que esse
Mata mesmo e sempre. Mata sim, sem contrição
Por força de trânsitos a que não demos atenção
E também, como nem sempre convém,
Por míngua de octanas de saúde
E ainda por decretos do Divino, daquele Divino
Sempre honrado, finalmente,
Pelo peregrinar do penitente.
Lastimo nunca ter sido penitente
Mas cumpro a minha jornada lealmente
Contra o Tempo, a destempo
Procurando evitar o contratempo inevitável
Não sei bem se do Motor Imóvel de Aristóteles
Se daquele Anjo Caído, Mefistófeles,
O monstro, o transviado, o grande cão
Que continua a peregrinar
( e a guiar, valha-nos Deus)
Sem carta de condução.
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