É uma subtil tarefa, esta de discriminar formas de prazer risonho. Uma das mais primárias, o cómico, opera por simples desfasamento em relação aos trilhos usuais da vida, fazendo-se acompanhar de um propósito de anárquica “desconstrução” do real. O cómico, em regra, usufrui da minimização dos outros. Encontramo-lo nos guizos com que os bobos medievais aturdiam as malfeitorias das dignidades feudais; vemo-lo nos desfiles carnavalescos e em certas figurações caricaturais; reconhecemo-lo no primarismo com que as crianças mofam dos tiques de adultos mais graves.
A ironia, por seu turno, encontra-se no degrau superior do cómico. Tem com ele relações de contiguidade, é certo. Mas assenta no princípio da contradição, da antífrase, praticando uma espécie de “coincidência de opostos” ; assim, passa um anão na rua e as almas mais rudes e descaroáveis dirão para o casual acompanhante: “Olha-me aquele gigante!”. E que dizer do humor ? É o irmão melancólico dos outros dois. Há nele o subtil reconhecimento das debilidades humanas e das fragilidades do vivido. O humor destila um pouco o perfume do barroco, do elaborado sofridamente nas profundezas do Eu. Trata-se aqui de uma melancolia combativa, como a desse condenado à morte que avança para o cadafalso numa segunda-feira e desabafa para o verdugo: “ Óptimo! A semana começa bem!”.
Pois é! Não basta rir. Urge conhecer a linhagem e os parentescos das diversas formas de riso. Saibamos sondar-nos através dos risos e sorrisos.
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