8 de março de 2011

A "MANIF" DO DIA 12


Por responsabilidades próprias e alheias, a “manif” do dia 12 está a assentar em imperdoáveis equívocos. O primeiro desses equívocos resulta do facto de alguns dos seus promotores terem vindo à praça pública para reclamarem a destituição de “toda a classe política”. Ora, como o conceituoso Louçã, o arrenegado Jerónimo e o impagável Alberto João, o “do jardim”, se apressaram a declarar a sua solidariedade ao evento – e talvez até a respectiva presença no mesmo – Portugal irá assistir a esta singularidade: a de três ilustres cidadãos exigindo, impantes e impávidos, que os destituam da cena política e os afastem como pestíferos (o que talvez não fosse demasiado mau). Por outro lado, a “geração à rasca” pratica uma espécie de fascínio maximalista. Não se limita a exigir o afastamento dos crapulosos, dos desonestos, dos desonrados, dos pulhas, dos traidores ao povo e ao país, dos apátridas. Nada disso: é necessário, segundo o seu parecer, destroçar, varrer, aniquilar, TODA a “classe política”. E aqui, ressoam nos meus ouvidos os consabidos anátemas de todos os totalitarismos. Também Lenine pediu, na Rússia, TODO o Poder para os sovietes; também Mussolini reclamou, em Itália, a extirpação de TODAS as oposições; também Hitler impôs, na Alemanha e depois no mundo, a perseguição a TODOS os judeus; também Salazar, mais melífluo, aconselhou, em Portugal, a filiação na União Nacional a TODOS os “bons portugueses”. É o bafio do “déjà vu” a intrometer-se no cotão da fatiota da “geração à rasca”. Um outro equívoco radica na pobreza das declarações de intenção. Quem se manifesta, deveria manifestar-se pela positiva: não queremos isto e preferimos aquilo; rejeitamos estas práticas, mas preconizamos que se adoptem aquelas; não queremos ir por esta viela, mas propomos que se caminhe por aquela azinhaga. Ou seja: uma manifestação ditada pelo puro e duro fascínio “manifestativo” é ainda mais pobre do que a pobreza material (efectiva e inaceitável) da “geração à rasca”. A “manif” do dia 12 arrisca-se a congregar o “lumpen mental” de Lisboa e do Porto – o que é verdadeiramente tragicómico, sobretudo se ponderarmos o grau de empenhamento cívico, lucidamente fundamentado, que é agora exigível a todos e a cada um de nós, no exausto Portugal de agora.

É verdade que uma boa parte da “classe política” portuguesa se instalou, com vilania velhaca, na fruição de prebendas inaceitáveis, no egoísmo de privilégios injustificáveis, na manigância de negociatas reles, no tripúdio de valores democráticos fundamentais. Mas desejar a inculcação da ideia de que TODA a “classe política” se atascou no lamaçal da indignidade é, em si mesmo, a demonstração da incompetência de diagnóstico de quem quer atirar a “geração à rasca” para o beco sem saída da impotência. E isto fornece aos desejosos da manutenção do “status quo” este argumento irretorquível: “Coitados dos rapazes. Nem ideias têm. Divertem-se em desfiles inócuos e nada mais”!

Nestes últimos dias, o apregoado carácter apartidário desta “manif à rasca” conheceu um novo e paradoxal desenvolvimento. Segundo alguns, o evento visaria sobretudo os não-sei- quantos-anos da prática governativa do PS e do PSD. Ou seja: já nem sequer se salva o putativo distanciamento que poderia assacar-se à rejeição do “sistema”. É apenas UMA PARTE do dito “sistema” que irá ser alvo de execração. Mas, afinal, em que ficamos: é TODA a “classe política” que se vai crucificar ou já só UMA PARTE dela? E quem acredita, lealmente, com a autenticidade dos que prezam uma coisinha elementar chamada Verdade, que as demais formações partidárias se encontram na completa Bem-Aventurança política, por uma espécie de desígnio providencial, de milagre continuado, de banho santo sem mácula?

A “geração à rasca” merecia mais. E merecia melhor. E deveria ter procurado melhor aconselhamento. É que, por este caminho, tudo aponta para que continue, de futuro, ainda mais “à rasca”…

5 comentários:

João de Castro Nunes disse...

O que, segundo o meu poético juízo, me parece estar em causa na mente dos promotores da manifestação aprazada para sábado,insigne Professor, não é propriamente a aceitação ou rejeição da Democracia em si, mas a maneira como entre nós vem sendo exercida... desastrada e desastrosamente. De resto, Professor, como justamente separar o trigo do joio, se este se encontra amancebado com aquele?! O que, a meu ver, a "Geração à rasca" pretende é a implantação de uma maneira "segura" de aplicar o "sistema" sem o desvirtuar no que ele tem de essencialmente positivo, ou seja, mantendo e fazendo respeitar a pureza e singularidade dos seus impreteríveis ideais. Será?! Foi nesse pressuposto que me veio à pena o poema "12 de Mqarço", que admirativamente gostaria de lhe dedicar. Aceita? JCN

João de Castro Nunes disse...

12 de MARÇO

Ao Prof. A. Carvalho Homem,
o meu último ídolo

Somos o fruto de uma geração
que não cuidou de nós como devia
quer no que diz respeito à educação
quer aos princípios da cidadania.

Deixaram-nos à rasca no que toca
aos nossos meios de sobrevivência:
além de nos faltar pão para a boca,
de mendigar estamos na iminência.

Importa questionar, desde a raiz,
esta governação que sem critério
levou à derrocada... este país.

Estamos fartos deste despautério:
venha um sistema que, pelo seguro,
nos deixe visionar... um bom futuro!

JOÃO DE CASTRO NUNES

João de Castro Nunes disse...

Dada a crise política actual
causada por senil decrepitude,
há que reconhecer que em Portugal
a voz pertence agora à juventude!

JCN

GP disse...

E mai nada!! Isto será um pequeno começo..quer queiram quer não. Agora os objectivos e as ideias estão um pouco confusas mas irão tornar-se mais claras. Como estamos é que não. Carrega JCN!!

Luís Alves de Fraga disse...

Senhor Professor João de Castro Nunes, permita-me (e também o meu Caríssimo Amigo Professor Amadeu Carvalho Homem, dono deste espaço) que o cumprimente e felicite pelo excelente soneto que escreveu e deixou nestas páginas. Curvo, respeitosamente, perante o seu Engenho e a sua Arte. Falecem-me as capacidades para alinhavar dois versos, mas não morreu em mim o gosto pela leitura da Poesia e de nela reconhecer as almas sensíveis dos Poetas. Muito obrigado, Senhor Professor Castro Nunes.