(Adaptado a partir de um conto medieval)
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Por névoas da manhã brumosa e fria
Deixando atrás queixumes de mulher
Partiu do lar a demandar seu ter
Um mercador de chã mercadoria.
Andou três anos por cerros e fronteiras
Três anos de saudade amarga e crua
Sem que uma só vez chamasse sua
A fêmea ocasional colhida em feiras.
E quando regressou ao seu telheiro
Dobrada a curva do último caminho
Espreitando pelo vidro com carinho
Viu esfolhada a flor do seu canteiro.
Entrou e quis saber, com voz distante
Se o Menino lindo que ali reverdecia
Era só o penhor do tempo que corria
E se já não era amado mas amante.
A mulher disse-lhe então, pressurosa,
Que não chegara o tempo de carpir
Pois com ninguém tinha sido amorosa
No intervalo do chegar e do partir.
“Foi pois um milagre, sou novo S. José?”
“Não, Senhor Marido, foi apenas a neve;
Comi-a certa vez por não estar ao pé
Da cantarinha onde beber se deve;
Então loguinho me soube abençoada;
O menino nasceu sem dar por nada
Foi a neve, Marido, foi a neve !”
Passaram quinze dias sem nevar
E ao décimo sexto disse o Homem
“Por regos e valados vou caçar
E levo este menino a ensinar
Honras e regras que se tomem”
Passaram oito dias sem voltar
Oito dias de sol severo e quente.
No regresso, o Homem vinha só
Ouviu-se a Mulher ranger de dó
E perguntar agora em tom diferente:
“ O Menino, que fizeste ao menino?”
“Que fiz, Mulher? (hoje está quente…)
Vi-o trepar com muito pouco tino
Na direcção do alto e do Destino
Ainda lhe gritei – “Menino da Neve,
Menino da Neve, nem mão nem pé
Devem passar por onde se não deve;
Mas ele foi subindo a caminho do céu
Mulher, o que aconteceu ao teu Menino?
Decerto o mesmo que finou o amor meu
Mulher, teu Menino de Neve … derreteu.
3 comentários:
Seu conto, Professor, mostra no fundo
que tudo quanto seja fingimento
não tem qualquer sucesso neste mundo
por manifesta falta de argumento!
JCN
Sob o efeito do calor
toda a neve se derrete:
tudo o que não tem valor
tem por destino a retrete!
JCN
Perante a literatice
da nossa praça académica,
esclerosada e anémica,
ou balofa doutorice,
o que valendo nos vai,
Professor, são seus escritos,
originais e bonitos,
em que a graça sobressai
com laivos de erudição
da mais fina inspiração!
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