21 de janeiro de 2010

O MEU HOMEM VITRUVIANO


Por volta de 1490, Leonardo da Vinci desenhou num caderno de notas a figura compósita de um homem, ao qual talvez tenha pretendido atribuir a proporcionalidade ideal, já proposta por Vitrúvio, arquitecto romano, no século I antes de Cristo. Este “homem vitruviano” contém-se nos limites de duas figuras perfeitas: o círculo e o quadrado. Quanto mais me dedico ao estudo da imagem mais me convenço que o acto de ver nos remete para o bornal das nossas simbologias particulares. A verdade é que, sem querer, identifico o quadrado como um espaço claustrado, asfixiante, como se nada mais representasse senão as paredes de uma prisão. Ainda sem querer, atribuo ao círculo uma dimensão libertadora, pois para mim o céu é infinitamente circular, por muito grande que este paradoxo possa ser. Na minha leitura, radicalmente subjectiva e provavelmente ignara, este “homem vitruviano” é representado por Leonardo na duplicidade da sua natural condição: um prisioneiro (quadrado) que aspira voar (círculo). Esta minha convicção, talvez delirante, é sustentada pela imagem duplicada e sobreposta que lhe confere sentido. Para mim – baixinho o confesso – aqueles dois braços de um mesmo homem, em posturas não coincidentes, são apenas as ambicionadas asas de alguém que se sabe agrilhoado, mas que aspira ao vasto horizonte do céu redondo, próximo e distante ao mesmo tempo.

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