18 de março de 2007

ONDE ESTAIS ?


"Ó oráculos dos deuses, onde estais?"
SÓFOCLES, Rei Édipo

No sobressalto de um sonho
perturbado
habitado de imagens sonolentas
virtuais
e diáfanas como a luz
da primeira manhã
a Natureza tece
(como Penélope)
uma teia sem fim.
Impassível nos recebe
no seu materno colo
mas não esconjura os medos
alojados nas pregas
da Existência tormentosa.
Somos para ela como se não fossemos
como se o nosso aparecimento traduzisse
um simples equívoco sem qualquer importância
sem sulco de verdade sem sombra de porvir.
Falar portanto em Destinos e Existências
é envolver em deliberadas aparências
o rosto augusto dessa Natura-Madre
que nos condena a morrer
com a mesma indiferença
com que nos fez viver.
Amanhã formigaremos por estradas sem fim
tão sem fim como a incompleta teia de Penélope.
Amanhã julgaremos estimável a ciência
que nos fizer perecer um instante mais tarde.
Amanhã surgirá novo sistema de filosofia
para que os homens permaneçam tão confusos como sempre.
Amanhã se abrirão conclaves de artistas e pintores
perenizando na Arte a hipóstase fugitiva da Beleza.
Mas amanhã vai também ser manhã
para logo depois chegar a tarde
e a noite vir por fim fechar o ciclo.
E seremos todos mais sábios mais contentes
e mais velhos um dia
um mês na cavalgada de dezenas de dias
um ano no desfiar dos meses impacientes
Não não é o Destino trágico
dos homens poetas ou prosaicos
que se nos dá na rotação obsidiante
da Madre Natureza
É ela só ela que aparece para escrever
o seu poema de enigmas sua cifra de ironias
na esfera redonda das maçãs do seu rosto
ou no útero ignoto em que recolhe
o sémen o desígnio e o decreto
dum Deus por descobrir.


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